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quarta-feira, 6 de novembro de 2024

ASCENSÃO DA EXTREMA-DIREITA NO BRASIL: UMA RETROSPECTIVA

 Por Ana Paula Soares

Este é o primeiro texto  de uma série em que o Pluris tenta entender a atuação da direita no país e seus efeitos na atualidade 

O cenário político brasileiro se transformou desde que a nova direita ganhou força e influência no Brasil. O âmbito da política no país lida com figuras como Jair Bolsonaro, Nikolas Ferreira e Pablo Marçal, personagens que resultam de um grupo de pessoas que careciam de um líder de direita em meio a crises. Dessa forma, a extrema-direita cresce de modo acelerado modificando a direita clássica a qual a população conhecia. Porém, qual foi o estopim para o triunfo dessa ideologia?

As ideias da nova extrema-direita brasileira, em que pese uma longa tradição, que se inicia com Plínio Salgado e seu movimento integralistra ainda na década de 1920, começaram a ser difundidas por Enéas Carneiro (PRONA), candidato à presidência que teve sua primeira aparição em 1989, na primeira eleição direta após 30 anos de ditadura. O candidato, que partilhava do ideário marxista durante parte de sua vida, aderiu às teses ultranacionalistas e anticomunistas, dentre elas a valorização da pátria, reforma da educação visando uma escola tradicional, a moral e os bons costumes, ensino bíblico, contrariedade ao aborto e relacionamentos homoafetivos. Após anos como candidato à presidência sem sucesso, Enéas foi eleito à Deputado Federal em 2002, período em que estabeleceu relações com o deputado de baixo clero, Jair Bolsonaro.

Mais tarde, em junho de 2013, durante o mandato de Dilma Rousseff (PT), milhares de brasileiros manifestaram seu descontentamento com o governo - não só federal, como com toda a estrutura política do país naquele momento - e tomavam as ruas como palco político. As redes sociais tornaram o alcance dessas manifestações maior, pois além de propagar as ideias pelas as quais a população lutava, também foram meios de organização e filiação de pessoas aos movimentos. Diversos grupos com diferentes crenças ideológicas ocupavam as ruas e impactavam o país e o mundo com tamanha mobilização, cada grupo com suas reinvindicações, mas o recado era o mesmo: o povo estava insatisfeito e exigia ser ouvido.

Embora o governo federal se esforçasse para contornar a situação, a aversão crescia mais a cada dia. O Partido dos Trabalhadores atingiu o nível de rejeição como nunca antes nas periferias, e a aproximação com a camada popular que havia colocado o PT no governo estava tomando o rumo contrário. Logo, o povo se encontrava em uma situação em que não havia uma figura representante. Essa lacuna de representatividade abriu espaço para que outra pessoa tomasse esse lugar, alguém que ganhava a simpatia do público devido às críticas ferrenhas à esquerda e que ocupava as ruas junto aos grupos de direita: o Jair Messias Bolsonaro. Nesse momento a extrema-direita se aproveitava das brechas que o caos do Brasil proporcionava: com discursos de um país melhor e da fé em Deus, a direita e a figura do “mito”, cresciam no imaginário popular.

Em 2016, os ataques contra a presidente se intensificaram. O discurso, sempre retomado para criticar a esquerda no poder, de anticorrupção, foi instrumentalizado pela extrema-direita por meio da Operação Lava Jato - investigação de esquemas de corrupção no país. As ruas novamente eram tomadas como cenário de revolta, a nova direita ecoava o hino do Brasil e vestia novamente as blusas verdes e amarelas para lutar pela saída da presidente.

A insatisfação generalizada resultou no impeachment de Rousseff. Em agosto do mesmo ano, Dilma foi afastada de suas atividades como Presidente da República, logo foi substituída pelo vice Michel Temer da direita clássica. Durante a votação de impeachment um discurso em específico marcaria o cenário político e desencadearia mais tarde uma direita que prega abertamente ideias inconstitucionais, o Deputado Jair Bolsonaro proferia uma saudação ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, um dos mais violentos torturadores da Ditadura Militar que resultou do golpe de 1964.

O nome Jair Bolsonaro ganhava destaque com o povo, entre muitos fãs e muitas pessoas que o odiavam, a figura do mito, como se intitulava, era cada vez mais conhecida. Com a popularidade e o reconhecimento que ele recebia, era dado início a uma grande campanha eleitoral que polarizava cada vez mais o cenário político brasileiro. Em 2018, Bolsonaro se tornou candidato à presidência e reuniu um grande número de eleitores que reproduziam sua ideologia. 

A campanha bolsonarista era fundamentada nos valores cristãos, família tradicional e nacionalismo, ele retomava algumas ideias que Enéas começara a disseminar em 1989. A fala agressiva, a identidade visual e a construção da propaganda política lembravam as tentativas de Enéas para presidência, porém para Bolsonaro o alcance aos eleitores era absurdamente maior.

Como opositor ao ex-militar, a esquerda tinha Haddad (PT), ex-ministro da educação de Luís Inácio Lula da Silva. A direita era cada vez mais forte e embora a esquerda resistisse, muitas pessoas ainda se recusavam a votar no Partido dos Trabalhadores após todos os acontecimentos passados. Durante as eleições de 2018 um grande fenômeno explodiu, as fake News, a direita construía sua campanha através da disseminação de notícias falsas inventadas para descredibilizar os partidos de esquerda e, infelizmente, um grande grupo de pessoas eram enganadas por essas mentiras. 

Além das ruas, as redes sociais agora eram o principal meio de mobilizar a população, a campanha digital de Jair Bolsonaro se destacou entre todos os candidatos. As falas absurdas do candidato à presidência se espalhavam com grande velocidade, tal como as fake News, entretanto as notícias verdadeiras ou a retratação desses discursos não engajavam tanto quanto o conteúdo produzido pela direita. Os próprios eleitores de esquerdas no intuito de criticar ou alertar a população compartilhavam os vídeos, porém esses acessos contribuíam para que o conteúdo digital ganhasse mais visibilidade. Essa prática ainda hoje é utilizada por figuras da extrema-direita como Nikolas Ferreira, atual Deputado Federal, e Pablo Marçal, candidato à prefeito em São Paulo.

Embora a tentativa da esquerda de resistir ao fenômeno do bolsonarismo, o candidato de direita ganhou as eleições no segundo turno com mais de 57 milhões de votos, e depois de muitos anos um presidente de direita foi eleito através da Eleição Presidencial. Os anos de governo do “mito” foram anos muito conturbados, além de muitos atos de oposição ao presidente o mundo enfrentava uma pandemia causada pelo vírus COVID-19. Jair Bolsonaro agiu com descaso com a população em meio a uma pandemia global e desastres naturais que aconteceram durante seu mandato, porém insistia em dizer que o problema do país eram a falta de moralidade e falta de Deus.

O que torna Bolsonaro uma figura memorável é a construção dele como um personagem, muitos políticos ainda utilizam dessa manobra após perceberem como ele obteve sucesso.

Nas eleições de 2022, a luta era de duas figuras de grande apelo popular: Lula foi hábil a se registrar no imaginário da população como um símbolo de esperança após quatro anos de um governo conturbado, ao passo que Bolsonaro insistia na imagem do defensor dos bons costumes.

Hoje, outubro de 2024, ocorreram as eleições municipais e foi possível perceber o reflexo de todos os eventos já mencionados durante todo o processo eleitoral, desde a campanha política aos dias de eleição, como a criação de um personagem para fixar na mente dos eleitores, a utilização das redes sociais como palco político e os vídeos e falas proferidas visando ser o assunto do momento nas redes sociais. O fenômeno do bolsonarismo alcançou todas as esferas.
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terça-feira, 30 de maio de 2023

A mídia e os farialimers

 A mídia tradicional se preocupa com o desenvolvimento do país? Como veículos de imprensa atuam como panfletos do mercado financeiro? Por que jornais de grande relevância como Estadão e Folha de São Paulo se posicionam a favor de medidas que beneficiam a Faria Lima e se opõem a medidas de crescimento do país?

Por Vitor Faria Silveira


Há quarenta anos o neoliberalismo surgia no mundo capitalista como uma norma forma de organização das relações de trabalho, que se caracterizou pelo desmonte do welfare state, o estado de bem-estar social, e com ele um processo agudo de precarização, por meio da desregulamentação, do trabalho. A produção por estoque estava em crise no capitalismo industrial, passando a dar lugar à produção por demanda, o que levou à prevalência do capitalismo financeiro sobre o capitalismo produtivo..


O sonho do capital sempre foi se desvencilhar da produção de mercadoria e acumular por si próprio, se libertando da dependência da indústria e tornando-se auto-acumulativo. Fazendo uma analogia à Biologia, isso é semelhante à forma como um câncer se origina, expande e entra em processo de metástase. Mas aqui o assunto é econômico para chegar à imprensa tradicional.


O neoliberalismo foi o “modo de produção” que permitiu ao capitalismo tornar-se financeiro, buscando capturar o Estado e seus serviços para a propriedade do capital, fazendo-o acumular descontroladamente. Aquela ideologia de que “Estado mínimo é um estado eficiente” mostrava-se uma falácia e o capital percebeu isso.



O capital não queria mais passar a ideia de que diminuir o tamanho do estado tornava a máquina pública eficiente. O capital não queria mais o estado mínimo, o capital queria que o estado fosse máximo. Entretanto, o capital não queria que o estado fosse máximo para todos, mas somente para si. O capital queria abocanhar o estado para si para que pudesse acumular sem passar pela produção. Além disso, o capital deu uma “compensação” a isso tudo. Ele forneceu o crédito, que permitia as pessoas consumirem apesar de não possuírem recursos suficientes. Assim urgiu o mercado financeiro, dominado por bancos.

O mercado financeiro é majoritariamente composto por bancos, que buscam captar clientes para aumentar seus lucros. No mercado, as indústrias que produziam mercadoria para gerar lucro foram jogadas na bolsa de valores para gerarem dividendos sem o processo de produção. Esse mercado distribui lucros oriundos da valorização das ações dessas empresas aos detentores das mesmas.

A partir disso, toda ideia e ação que governos que buscam industrializar e desenvolver seus países com políticas públicas e medidas sociais de redução de desigualdades sociais e melhora da qualidade de vida de seus povos tomam, os mercados financeiros do mundo se assustam e se retraem. O mercado é o detentor da dívida pública que esses países contraíram para promover o desenvolvimento social, industrial e habitacional de si mesmos. O receio era de que os investimentos feitos pelos governos sociais-democratas os impedissem s de honrarem suas dívidas com os mercados. Como o capital abandonou a indústria e se acumula no mercado financeiro, ele precisa de mecanismos para acumular.

No Brasil, o capital conseguiu tornar o Banco Central brasileiro autônomo do Governo Federal. Esse fato fez o mercado colocar no Banco Central seus representantes como diretores do mesmo para que seus propósitos fossem executados mesmo com a entrada de um governo social-democrata. Atualmente, o Banco Central, que não é comandado por indicados do atual governo, eleva e mantém a taxa básica de juros, a chamada Selic, em 13,75%, a mais alta taxa de juros do mundo. Esse elevado percentual prejudica a geração de empregos, a elaboração de políticas públicas, os investimentos em industrialização do país e só beneficia aqueles que vivem do rentismo, que ocorre através do pagamento de dividendos gerados pela valorização das ações das empresas na bolsa ou do dinheiro depositado em contas nos bancos.

A imprensa tradicional sempre seguiu os ideais liberais e neoliberais da burguesia, que deixou de ser burguesia a partir de quando não se preocupou mais com o burgo. A mídia hegemônica sempre se beneficiou do liberalismo e do neoliberalismo. Devido a isso, ela age como veículo de propaganda de ideias liberais.


O jornal Estado de SPaulo, o Estadão, sempre foi um veículo de imprensa conservador e liberal economicamente. O jornal, pertencente a um dos maiores conglomerados de mídia do Brasil, é conhecido por pregar a favor do neoliberalismo e de políticas defendidas pela direita dita republicana - embora, não raro, defenda posições de governos autoritários. Em contrapartida, a Folha de S.Paulo possuía ideias progressistas, de defesa do crescimento do país por meio de investimentos do Estado - não obstante foi um dos apoiadores da ditadura militar no Brasil, implantado com o golpe de estado tramado pelas elites burguesas nacionais.

Após a eleição do presidente Lula, em 2022, a Folha, se juntando ao Estadão, passa a pregar contra as propostas do então governo eleito para a gestão do país. Prova disso é a alta ofensiva contra o presidente que critica a alta da Selic e passa a defender ostensivamente a manutenção da taxa em 13,75%, com o uso da mesma justificativa do diretor do BC, Roberto Campos Neto, indicado por Jair Bolsonaro, presidente da República até 2022, que diz que a taxa de juros se mantém devido a alta da inflação por demanda.


A justificativa mostra-se uma falácia de proporções gigantescas, já que o consumo das famílias está em níveis absurdamente baixos, a quantidade de dinheiro circulante na praça também é pífio, enquanto os lucros registrados pelos bancos e o aumento do patrimônio e fortunas dos maiores bilionários/milionários do Brasil é gigantesco.


Jornais como o Estadão e a Folha não obtêm lucros do consumo de conteúdo produzido por eles mais, eles arrecadam dividendos através de entidades financeiras que fazem parte do conglomerado de empresas às quais ambos os jornais pertencem. Prova disso é a queda de qualidade dos conteúdos produzidos pelos seus jornalistas, que elaboram materiais de baixa qualidade se tratando de pautas econômicas, opiniões acerca de questões político-econômicas e justificativas que defendem posições neoliberais.


Pode-se perceber que tais veículos, somado a emissoras tradicionais neoliberais, não prezam pelo crescimento do país, pela redução da distância entre as classes sociais e pela promoção de um país melhor para se viver. A mídia tradicional neoliberal preza, claramente pelos privilégios e rentismo promovido pela financeirização, já que veículos como o Estadão, a Folha, Grupo Globo, CNN e outros grupos, são entidades que estão imersas na financeirização. Portanto medidas governamentais que visam o progresso soam ameaçadoras aos interesses da financeirização.


Na financeirização, jornalistas com visão progressista e desenvolvimentista são colocados de lado, enquanto profissionais da mídia com posicionamento financeirizado possuem maior espaço de visibilidade e atuação nos veículos de grande porte como são a mídia tradicional no Brasil.


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