A relação umbilical entre capitalismo financeiro internacional e mídia corporativa, inclusive a brasileira, é um processo que acontece há mais de 40 anos, mas somente nos últimos 20 anos se intensificou
Por Vitor Faria Silveira
A imprensa brasileira passou por muitas mazelas durante o regime militar, que perdurou entre 1964 e 1985. Após o estabelecimento do AI-5 em 1968, a ditadura militar restringiu ainda mais o que a imprensa brasileira poderia produzir. o Jornalista Vladimir Herzog, preso e morto por agentes da ditadura militar em 1975, é um caso bastante emblemático do que o período militar foi capaz de fazer com os profissionais de mídia daquela época.
Após 21 anos de regime militar e com os movimentos sociais ocupando as ruas do país para reivindicar a volta da democracia, a ditadura se encerrou com as Diretas Já, reestabelecendo o processo democrático eleitoral no país. O problema é que o legado da truculência autoritária do período não foi apenas político. Ao final da ditadura, o Brasil tinha sua economia completamente estraçalhada.
O Brasil começou o processo de desindustrialização do país no início dos anos 1980, com a introdução do neoliberalismo na política econômica brasileira. O mercado financeiro foi introduzido no país para redefinir o novo modo de produção que se tornaria o predominantemente adotado pela elite nacional. O modelo fordista de produção estava ficando para trás para dar lugar ao processo de produção por demanda. Nessa transição, os grandes conglomerados de mídia migraram para esse modelo.
A elite industrial, que produzia seu lucro a partir da produção de mercadoria de suas fábricas, colocou suas empresas no mercado financeiro e passaram a expropriar o lucro a partir da especulação da bolsa de valores. Com os conglomerados de mídia o processo não foi diferente. Esses grupos, que hoje detêm empresas de produção de produtos financeiros em suas composições e que são ações negociadas e vendidas no mercado financeiro, também detêm a expropriação da mais valia através da especulação da bolsa de valores ou da compra de títulos da dívida pública.
O mercado financeiro, do qual alguns conglomerados de mídia fazem parte, principalmente Grupos Globo e Folha e seus braços financistas, possui uma agenda que costuma estar alinhada com a de políticos de direita e não raro de extrema direita. Esses grupos endossam uma ideia liberal para poderem obterem lucro com através de serviços que deveriam ser promovidos pelo Estado através da arrecadação de impostos.
Além do pensamento liberal, o mercado financeiro detém grande parte do financiamento da dívida pública com o Tesouro Nacional. É através da compra de títulos da dívida que advém boa parte da renda dos aplicadores do mercado financeiro. Aplicar capital em títulos da dívida pública é um investimento de segurança em renda fixa que muitos investidores apostam para obter seus lucros. A imprensa tradicional é um meio de grande utilidade para economistas do mercado financeiro e jornalistas econômicos que atuam em favor do mercado financeiro.
A mídia tradicional ou corporativa (leia-se Grupos Estadão, Folha, Globo e entre outros) é parte do mercado financeiro e dá voz aos porta-vozes do mercado. Por isso e por serem grupos compostos, em parte, por empresas que produzem produtos financeiros, que vemos cada vez mais economistas, analistas e outros profissionais do mercado financeiro tem participação cada vez maior nas colunas e editorias dos maiores jornais do país e nos telejornais diários das emissoras (Globo).
O jornalismo, que deveria ser a escola do cidadão e escola de cidadania para os indivíduos da sociedade, com a financeirização da economia e da mídia tradicional, tornou-se uma atividade de defesa do capitalismo financeiro e improdutivo. Faz-se necessário, através de um entendimento maior, através do estudo, da politização e de uma democracia mais participativa, que o país possa promover uma reindustrialização para puxar a educação a uma melhor qualidade para produzir melhores profissionais, cidadãos e sociedade politizada.
Mas, ainda mais urgente, é instrumentalizar a sociedade para essa reeducação - e isso é papel da mídia e muito especialmente do jornalismo. Em outras palavras: se desejamos vislumbrar algum traço de democracia no futuro, precisamos, atores de mídia, incluindo jornalistas, excluídos dos grandes grupos corporativos, nos movimentarmos para fazermos cumprir o desígnio da comunicação como direito e do jornalismo como um pilar para a democracia.
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