quinta-feira, 29 de junho de 2023

Financeirização da imprensa brasileira: quando e por que esse fenômeno aconteceu no Brasil

 A relação umbilical entre capitalismo financeiro internacional e mídia corporativa, inclusive a brasileira, é um processo que acontece há mais de 40 anos, mas somente nos últimos 20 anos se intensificou

Por Vitor Faria Silveira

A imprensa brasileira passou por muitas mazelas durante o regime militar, que perdurou entre 1964 e 1985. Após o estabelecimento do AI-5 em 1968, a ditadura militar restringiu ainda mais o que a imprensa brasileira poderia produzir. o Jornalista Vladimir Herzog, preso e morto por agentes da ditadura militar em 1975,  é um caso bastante emblemático do que o período militar foi capaz de fazer com os profissionais de mídia daquela época. 

Após 21 anos de regime militar e com os movimentos sociais ocupando as ruas do país para reivindicar a volta da democracia, a ditadura se encerrou com as Diretas Já, reestabelecendo o processo democrático eleitoral no país. O problema é que o legado da truculência autoritária do período não foi apenas político. Ao final da ditadura, o Brasil tinha sua economia completamente estraçalhada.

O Brasil começou o processo de desindustrialização do país no início dos anos 1980, com a introdução do neoliberalismo na política econômica brasileira. O mercado financeiro foi introduzido no país para redefinir o novo modo de produção que se tornaria o predominantemente adotado pela elite nacional. O modelo fordista de produção estava ficando para trás para dar lugar ao processo de produção por demanda. Nessa transição, os grandes conglomerados de mídia migraram para esse modelo.

A elite industrial, que produzia seu lucro a partir da produção de mercadoria de suas fábricas, colocou suas empresas no mercado financeiro e passaram a expropriar o lucro a partir da especulação da bolsa de valores. Com os conglomerados de mídia o processo não foi diferente. Esses grupos, que hoje detêm empresas de produção de produtos financeiros em suas composições e que são ações negociadas e vendidas no mercado financeiro, também detêm a expropriação da mais valia através da especulação da bolsa de valores ou da compra de títulos da dívida pública.

O mercado financeiro, do qual alguns conglomerados de mídia fazem parte, principalmente Grupos Globo e Folha e seus braços financistas, possui uma agenda que costuma estar alinhada com a de políticos de direita e não raro de extrema direita. Esses grupos endossam uma ideia liberal para poderem obterem lucro com através de serviços que deveriam ser promovidos pelo Estado através da arrecadação de impostos.

Além do pensamento liberal, o mercado financeiro detém grande parte do financiamento da dívida pública com o Tesouro Nacional. É através da compra de títulos da dívida que advém boa parte da renda dos aplicadores do mercado financeiro. Aplicar capital em títulos da dívida pública é um investimento de segurança em renda fixa que muitos investidores apostam para obter seus lucros. A imprensa tradicional é um meio de grande utilidade para economistas do mercado financeiro e jornalistas econômicos que atuam em favor do mercado financeiro.

A mídia tradicional ou corporativa (leia-se Grupos Estadão, Folha, Globo e entre outros) é parte do mercado financeiro e dá voz aos porta-vozes do mercado. Por isso e por serem grupos compostos, em parte, por empresas que produzem produtos financeiros, que vemos cada vez mais economistas, analistas e outros profissionais do mercado financeiro tem participação cada vez maior nas colunas e editorias dos maiores jornais do país e nos telejornais diários das emissoras (Globo).

O jornalismo, que deveria ser a escola do cidadão e escola de cidadania para os indivíduos da sociedade, com a financeirização da economia e da mídia tradicional, tornou-se uma atividade de defesa do capitalismo financeiro e improdutivo. Faz-se necessário, através de um entendimento maior, através do estudo, da politização e de uma democracia mais participativa, que o país possa promover uma reindustrialização para puxar a educação a uma melhor qualidade para produzir melhores profissionais, cidadãos e sociedade politizada.

Mas, ainda mais urgente, é instrumentalizar a sociedade para essa reeducação - e isso é papel da mídia e muito especialmente do jornalismo. Em outras palavras: se desejamos vislumbrar algum traço de democracia no futuro, precisamos, atores de mídia, incluindo jornalistas, excluídos dos grandes grupos corporativos, nos movimentarmos para fazermos cumprir o desígnio da comunicação como direito e do jornalismo como um pilar para a democracia.

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quarta-feira, 28 de junho de 2023

Um Deus do ódio

 O uso perverso da fé cristã como ferramenta de preconceito, intolerância e incentivo à violência contra minorias

Por Paulo Henrique Lima,

“Amados, amemo-nos uns aos outros, porque o amor é de Deus; e todo aquele que ama é nascido de Deus e conhece a Deus. Aquele que não ama não conhece a Deus, pois Deus é amor." - 1 João 4:7-8 (Bíblia Sagrada) 

Assim como nesta passagem, é ensinado na religião cristã a presença de um forte Deus onipresente, onisciente, onipotente, bondoso e misericordioso. Entretanto, a religião se mostra rendida aos dogmas adquiridos como princípios e práticas irrefutáveis dentro da fé. Estes dogmas desempenham um papel importante na definição da identidade e coesão de uma religião ou igreja, fornecendo limites para a crença e a prática. Eles são frequentemente formulados e proclamados por autoridades religiosas com verdades inquestionáveis, destinadas a serem mantidas pelos fiéis.

Recentemente, o pastor André Valadão, líder da Lagoinha Orlando Church, fez publicações de cunho preconceituoso nas redes sociais. No dia 4 de junho, o pastor publicou um post que dizia “Deus odeia o orgulho”, a palavra orgulho em cores da bandeira LGBTQIA+. Não é por coincidência que o pastor escolheu o mês considerado do Orgulho LGBTQIA+ para fazer a publicação de duplo sentido com a palavra “orgulho”. Em um dos trechos deste culto, o pastor diz que junho seria um mês da humilhação, devido ao pecado, e pecado gera humilhação e vergonha. O mesmo diz que os fiéis, presentes no culto, não seriam dominados pelo pecado pois estariam debaixo da graça. Na pregação, é citado o versículo 1 João 1:9Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda a injustiça.

Mas o que seria o pecado para eles? O que realmente agrada ou desagrada a esse Deus que odeia? Como esse discurso baseado na ira de um Deus sob a vida do que alguns julgam como abominação reflete na política do ódio polarizado na sociedade? Esses discursos vão além de uma interpretação. Essas crenças e princípios estabelecidos com base nos textos sagrados e tradicionais são rigidamente mantidos e não há espaços para questionamentos ou interpretações contextualizadas, de que surgem os preconceitos radicais. Embora a religião possa desempenhar um papel positivo na vida das pessoas, fornecendo orientação moral e espiritual, é importante reconhecer que os dogmas, quando mal interpretados ou aplicados de maneira extremista, podem ter consequências negativas.

Como exemplo do pastor André Valadão compartilhando frequentemente postagens homofóbicas, além de incentivar as tags “nopride” e “orgulhonao”, contribuindo para a marginalização de certos grupos sociais. São considerados como “pecadores” ou “inferiores” àqueles que não vivem da maneira estabelecida pela comunidade religiosa. Esses preconceitos baseados nas crenças e tradições contribuem ainda mais para a negação dos direitos e dignidade desses grupos na sociedade. As pregações se tornam ferramentas para a promoção de políticas de ódio. Líderes, que ainda têm a sua parcela significativa de influência na opinião pública, são capazes de moldar as políticas com base em preceitos religiosos inflexíveis para restringir a liberdade individual, promover a exclusão e fomentar divisões sociais.


Em tempos de incertezas, conflitos e desafios, a sociedade frequentemente procura respostas e orientações para encontrar um sentido maior em suas vidas. Nesse contexto, é comum que essas instituições religiosas assumam um papel de destaque, oferecendo direção espiritual e esperança para os seguidores. No entanto, essa influência se torna perigosa quando se reflete sobre a fragilidade inerente à sociedade que leva muitos a se apoiarem exclusivamente na palavra que se encontra dentro das igrejas. 

As questões sociais, econômicas e políticas têm impactos significativos no bem-estar das pessoas, gerando ansiedade, medo e desesperança. Nesse cenário, é compreensível que muitos indivíduos busquem refúgio nos templos e igrejas, esperando encontrar respostas e conforto emocional. Aí encontra-se o perigo do poder de alguns líderes. Enquanto alguns são verdadeiros guias espirituais, comprometidos com os princípios do amor, compaixão e justiça, outros podem abusar de seu poder, manipulando a fé das pessoas em benefício de suas próprias crenças.  

A adoração cega a esses líderes pode resultar em consequências negativas, como a disseminação do ódio e intolerância, em vez de promover a verdadeira paz e harmonia. Afinal, como Deus seria amor se ele odiasse? O amor é capaz de odiar? A dependência excessiva da esperança oferecida pelas igrejas pode limitar a capacidade das pessoas de enfrentarem os desafios da vida de forma independente ou construtiva.

Ao transferir toda a responsabilidade para pastores ou outros guias espirituais, corre-se o risco de negligenciar a importância da ação individual e coletiva na construção de uma sociedade mais justa e empática. Questionar a influência dos líderes dessas instituições não significa negar a importância da fé e da esperança encontradas nas igrejas. No entanto, é fundamental adotar uma abordagem crítica, buscando um equilíbrio saudável entre a confiança em verdadeiros chefes cristãos e o desenvolvimento de uma autonomia pessoal. A sociedade precisa reconhecer sua própria força e capacidade de agir para promover mudanças positivas.  

Líderes como André Valadão reconhecem o seu poder de influência sob os demais fiéis e se aproveitam do espaço público para promover mais ódio a essas classes sociais. Propagando a palavra de um Deus odioso, uma mensagem que foca em presumidos desvios, pecados e que julga os demais cidadãos que não se sustentam em uma crença baseada na ideia de “nós, cristãos, estamos debaixo da graça, santificados, contra eles, pecadores e abominados pelo nosso Deus” - uma mensagem assim não apenas propaga o ódio, não é apenas contra a vida: ela mata!

Vale lembrar que André Valadão já foi acusado outras vezes de propagar informações falsas contra o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva. E o mesmo se retratou na internet mentindo, mais uma vez, dizendo que o TSE o havia intimado a negar que Lula seja a favor do aborto e da descriminalização das drogas. Na época, a corte negou a existência da decisão. Entretanto, o pastor usou da narrativa de “perseguido”, com imagens gravadas em um fundo escuro, roupa preta, para transparecer a ideia de que estava sendo silenciado ou forçado a se retratar. O vídeo em questão acumula mais de 15 milhões de reproduções. 

É fundamental compreender que os dogmas religiosos podem e devem ser interpretados de maneira contextualizada, levando em consideração a evolução social, os avanços científicos e a compreensão cada vez mais ampla dos direitos humanos. Uma interpretação aberta, inclusiva e compassiva dos preceitos religiosos pode permitir que eles sejam fonte de inspiração e bem-estar espiritual, ao mesmo tempo em que respeitam a diversidade e promovem a coexistência pacífica. 

É importante destacar que nem todos os fiéis praticantes adotam uma visão dogmática inflexível. Muitos seguidores de diferentes religiões têm uma compreensão mais inclusiva e progressista de suas crenças, buscando conciliar sua fé com o respeito pelos direitos e a valorização da diversidade humana. Para evitar que a doutrina religiosa se transforme em preconceitos e políticas de ódio, é necessário promover o diálogo inter-religioso, a educação para a tolerância e o respeito mútuo. É fundamental encorajar a reflexão crítica, a abertura ao conhecimento e o reconhecimento dos valores fundamentais dos direitos humanos.



 


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terça-feira, 27 de junho de 2023

A economia nos governos Lula e a "sorte" que o persegue

  Uma análise fundamentada dos feitos conquistados


Por Maria Eduarda Salgado 


Ao longo dos governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é notória a trajetória econômica positiva que o Brasil experimentou. No entanto, alguns críticos, desafetos de Lula, insistem em afirmar que sua gestão foi apenas fruto de sorte, uma maneira de minimizar seus feitos e conquistas. Dito isso, uma análise aprofundada dos acontecimentos revela que seus resultados econômicos foram fundamentados em políticas competentes e estratégicas, não em meros acasos.


Desde o início de sua jornada política, Lula demonstrou resiliência e determinação, superando obstáculos e desafiando as expectativas. Sua origem humilde, como migrante nordestino, moldou sua personalidade e fortaleceu sua determinação em trazer mudanças para o país. Ao ser eleito presidente por três vezes, Lula não apenas ignorou as críticas de falta de competência, mas também mostrou que suas habilidades políticas iam além da sorte. Sua trajetória de sucesso é um testemunho de seu compromisso com a transformação do Brasil.


Uma das críticas frequentes é a alegação de que Lula depende da sorte quando precisa negociar com o Congresso Nacional. Contudo, é evidente que sua capacidade de articulação política e o apoio conquistado no Senado e no Supremo Tribunal Federal são fundamentais para garantir avanços em sua gestão. Recentemente, o Supremo formou maioria de votos a favor da incidência do PIS/Cofins sobre toda a atividade empresarial, uma vitória para a União. Essa decisão, que beneficiará a seguridade social e a arrecadação em R$ 115 bilhões, reflete a importância de políticas econômicas consistentes e bem fundamentadas.


Ainda, é importante salientar que a economia global tem sido favorável ao Brasil durante o governo de Lula. Contrariando as expectativas de uma atividade mundial mais fraca, o país tem obtido resultados positivos na balança comercial, com previsões de um superávit recorde acima de US$ 70 bilhões em 2023. Essa conjuntura positiva é resultado não apenas da sorte, mas também das políticas adotadas pelo governo, que trouxeram estabilidade e confiança aos mercados.


Os programas sociais implementados durante os governos de Lula, como o Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida, a Farmácia Popular e o Mais Médicos, têm trazido benefícios reais para a população brasileira. O recente lançamento do programa Desenrola, que auxiliará famílias de baixa renda com dívidas, é mais uma prova do compromisso do governo com a inclusão social e a redução das desigualdades. Essas iniciativas são resultado de políticas planejadas e implementadas com base em sólidos fundamentos, não de meras coincidências ou sorte.


É evidente que o sucesso dos governos de Lula vai além da sorte. O ex-presidente demonstrou habilidade ao buscar o diálogo com setores que, inicialmente, não o apoiavam, como o agronegócio. Essa aproximação resultou em uma maior estabilidade política e econômica, mostrando que a competência e o compromisso podem superar divergências ideológicas.



Diante dos avanços conquistados pelo Brasil durante os governos de Lula, é hora de reconhecer que suas capacidades políticas excedem as expectativas. A economia em ascensão, os programas sociais bem-sucedidos e a estabilidade política são resultados de um trabalho árduo e de políticas públicas bem fundamentadas. A "sorte" mencionada por alguns críticos não passa de uma tentativa simplista de diminuir o impacto positivo de uma gestão comprometida com o desenvolvimento e o bem-estar da população brasileira.


Nesse sentido, é importante olhar além das narrativas superficiais e reconhecer o legado positivo deixado pelos governos de Lula. O Brasil alcançou patamares mais elevados de desenvolvimento graças às políticas econômicas consistentes, à competência e à visão estratégica de seu líder. É hora de valorizar a capacidade de transformação e o compromisso com o progresso, em vez de perpetuar visões distorcidas e desprovidas de fundamentos.


É importante ressaltar que a crítica construtiva é fundamental para aprimorar qualquer governo e buscar melhorias para a sociedade. No entanto, atribuir o sucesso de Lula apenas à sorte é minimizar os méritos de suas ações e subestimar sua competência como líder político. Seus feitos econômicos, a estabilidade alcançada e a implementação de programas sociais bem-sucedidos são resultados de uma visão estratégica e de um compromisso genuíno com o bem-estar da população.



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