segunda-feira, 17 de outubro de 2022

O debate virou lacração

 Por Laís Abreu

As eleições deste ano, entre outras lições, colocam em dúvida o formato dos debates e sua utilidade no processo democrático

 

 

Com a chegada de Jair Bolsonaro na presidência em 2018, sem ter tido grande tempo de campanha televisiva devido ao fato de ter sido vítima de uma facada, tivemos uma mudança na forma como o Jornalismo Político era realizado no Brasil. A ascensão das mídias digitais nesse processo acabou tomando uma proporção maior, no qual as pessoas se expressam mais e replicam a todo momento tudo que é publicado, por isso, para os candidatos à presidência no país, um debate em rede nacional, vai muito além de informar o povo, mas fazer seu próprio marketing pessoal.

Na era política que vivemos, quem assistiu ao debate presidencial da Rede Globo no último dia 29 conseguiu observar a desvão ético, focado em troca de farpas, pegadinhas, alvoroço, perguntas e respostas com intuito de lacrar nas redes sociais, sem ter foco no que realmente importava: o presente e futuro do Brasil. Os internautas chegaram a questionar qual o critério dos escolhidos para participar, considerando que o candidato do PTB, Padre Kelmon, desequilibrou a mesa, inclusive o apresentador William Bonner. Aqui valem a ressalva e o esclarecimento: a lei eleitoral brasileira indica que participam dos debates os candidatos cujos partidos têm superado a cláusula de barreira eleitoral no Congresso Nacional.

 

Seja como for, os debates deste pleito mostram que não apenas a lei eleitoral precisa ser atualizada -  os próprios debates estão desgastados, seu formato já não atrai e muito menos cumpre o papel de esclarecimento público a que se destinam. O que os candidatos querem é vender frases de efeito que a equipe de marketing fará circular naquele mesmo segundo. Um exemplo disso foi a concorrente Soraya Thronicke (UB) ao chamar o opositor de ‘’padre de festa junina’’ que virou meme. 

 

O que se observa é uma criação de material que vai circular e favorecer os candidatos, mas que nada ajudam na democracia, considerando que pouco esclarecem os objetivos dos participantes. O circo é armado e tudo que nele é dito serve apenas como vitrine para as outras formas midiáticas existentes. 

Uma solução para esse show de horror e desqualificação do jornalismo político na TV seria diminuir os embates e guerras entre os pretendentes à presidência e colocar mais a participação do povo. Além disso, uma opção fundamental é informar ao telespectador, ao vivo, sobre o que é dito pelos participantes, haja vista que muitos propagam dados errados e muita fake news, como fez Ciro Gomes (PDT) ao afirmar: "60% das nossas escolas já são em nível médio em tempo integral." Sendo que o dado correto corresponde apenas a 45% segundo o Censo da Educação Básica de 2021.

Que o Marketing eleitoral seja colocado à parte, essa nova ordem da comunicação política, conectada a outros diversos fatores, traz a cobertura jornalística um desafio a rever os padrões e assim diminuir o palco dado para propagação de discursos insustentáveis. Dessa forma, o jornalismo político brasileiro conseguirá atingir maior credibilidade. 


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segunda-feira, 10 de outubro de 2022

A gravidez de Cláudia Raia e a insensibilidade diante de uma mulher grávida


Por Laís Abreu,

 

No dia 19 de setembro, a internet foi surpreendida por uma notícia: a atriz Claudia Raia revelou, por meio de seu Instagram em um vídeo no reels, que estava grávida aos 55 anos. Com dois filhos adultos, ela já havia entrado na menopausa, mas sonhava em dar à luz a uma criança advinda de seu relacionamento com Jarbas de Mello, com quem se casou em 2018. 

 

A notícia - e as críticas, costumeiramente maliciosas - se espalharam rapidamente. No jornalismo, não foi diferente. O Jornal Folha de S.Paulo, por meio da coluna “Colo de Mãe” escrita por Cristiane Gercina, teve a audácia de publicar uma matéria com a manchete “A gravidez de Claudia Raia e o desserviço a quem tenta engravidar”. Com uma chamada no perfil do jornal no Instagram, artistas como Tatá Werneck e Sasha Meneghel deixaram sua indignação nos comentários do post.  

 

Uma matéria invasiva e etarista, que questionava a omissão de Claudia, ao optar por não anunciar que tinha feito fertilização in vitro, um procedimento feito em laboratório, em uma idade considerada avançada para a reprodução. Diante de um jornalismo como esse, observamos que mulheres são massacradas todos os dias e, de diferentes formas, somos cobradas por simplesmente existir e enquanto o próprio jornalismo brasileiro fomentar esse ódio nada irá mudar. 

 

Com tantas pautas importantes, tantas coisas boas a se noticiar e falar sobre a gestação de uma mulher, cobrar um posicionamento sobre o método de gravidez, que não foi escondido em momento algum, considerando que em entrevistas de 2020 e 2021 o casal sempre relatou a vontade de serem pais e também sobre o congelamento de óvulos, demonstra que há muito a melhorar.  

 

Em pleno século XXI, nas vésperas de uma eleição importante e decisiva no país, um dos principais veículos de comunicação dá espaço para uma mulher criticar a outra, sendo pior ainda uma mãe criticar uma gestante, isso sim é um desserviço. Uma opinião que não deveria ter ido pro ar, que fez leitores questionarem a ausência de um editor chefe no jornal Folha diante de palavras totalmente desnecessárias.  

 

São por pautas assim, que devemos lutar contra esse tipo de jornalismo, as consequências dessas publicações são sempre enormes, perdem não só as mães, mulheres, mas também, nós, os próprios jornalistas.


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quinta-feira, 6 de outubro de 2022

PROGRAMAS ESPORTIVOS EM TV: NOTAS INTRODUTÓRIAS

Por Ígor Borges

Os tipos de proximidade e abordagem com o consumidor


Os programas esportivos na TV, aberta e especialmente fechada, brasileira se baseiam em comentários, análises e reportagens relacionadas aos jogos, acontecimentos e fatos ligados ao âmbito. Todavia, são várias as maneiras de abordagem entre esses programas, seja pelo público que acompanha, pela rede televisiva, pelos profissionais ou pelo enfoque do mesmo. Além disso, pode-se considerar que cada meio é diferente de outro, mesmo que os assuntos ou os fatos sejam idênticos.

Dito isso, analisando dois programas esportivos de emissoras diferentes, percebem-se as diferenças de abordagem, uso de termos, enfoque, nível de “expertise” por parte dos apresentadores e repórteres. Essa diferença pode ser explicada por dois fatores: as duas emissoras em questão tratam-se de uma aberta e uma fechada; o público alvo e os profissionais se divergem bastante. 

Um dos programas analisados foi o Jogo Aberto, da TV Bandeirantes. Enquanto isso, a segunda análise foi feita com o Linha de Passe, da TV fechada do grupo Disney, a ESPN, focada na programação esportiva. 


Jogo Aberto

O programa da Band é transmitido de segunda a sexta, durante o período da manhã/almoço e é marcado pela sua bancada. Os apresentadores, Renata Fan e Denílson Show, realizam um giro pelas matérias dos clubes de futebol, mais especificamente dos clubes do Brasil. O programa possui diferentes versões conforme o estado de transmissão, sendo que o analisado, é transmitido pelo estado de São Paulo, e, portanto, foca nos clubes dessa região.

O Jogo Aberto é dividido em duas partes. A primeira delas faz um giro pelos principais acontecimentos esportivos do dia, mostra resultados de jogos, reportagens do dia a dia dos clubes, gols da rodada. Ela ainda conta com pequenos comentários dos apresentadores entre as matérias, sempre de uma forma leve e com linguagem coloquial, e com a presença de brincadeiras e momentos de descontração. 

Na segunda metade do programa, ocorre o debate entre os apresentadores, de que participam outros, outros integrantes são acrescidos ao programa, tais como o ex goleiro Ronaldo Giovanelli, o narrador Ulisses Costa, e o comentarista Heverton Guimarães. Nesse período, o debate discorre sobre o principal assunto do dia, e ocasionalmente, ocorrem “zoações” entre os apresentadores, que nesse caso, tem seus clubes do coração revelados ao público. Um exemplo disso, é a tradicional “maca do eliminado”, que ocorreu em um dos dias analisados, com Denílson Show sofrendo a cena pela eliminação do Palmeiras na Libertadores. 


Linha de Passe

Transmitido todas as segundas, quartas, quintas-feiras e domingos, o Linha de Passe é um dos carros chefes da ESPN Brasil, rede de televisão fechada focada em esportes. No programa, são debatidos vários assuntos recorrentes aos fatos esportivos dos últimos dias, além da apresentação de resultados, matérias e entrevistas exclusivas. Comumente, o programa é apresentado pelos jornalistas mais badalados da emissora, tais como Paulo Andrade, Nivaldo Pietro, William Tavares, além dos escalados nos jogos da rodada, os quais entram ao vivo para comentar sobre.  Durante o desenrolar das pautas, os comentaristas abordam os jogos em si, com análises táticas, discussões acerca de arbitragem, e das polêmicas do extracampo. 

O programa conta com o debate como principal engajamento, uma vez que, os jornalistas presentes na mesa, possuem opiniões fortes e têm discussões pertinentes sobre os assuntos abordados. Além disso, o Linha de Passe possui uma linguagem mais técnica sobre os esportes (majoritariamente futebolística), e por isso, é mais aclamado pelo público que acompanha arduamente, não só seu time do coração, mas todos as partidas de futebol possíveis. Nesse caso, diferentemente dos programas de TV aberta, os apresentadores mantêm seus times do coração ocultos, a fim de evitar mais polêmicas. 


A título de comparação 

Enfim, a discussão entre os dois programas é a seguinte: cada um deles lida com públicos, “chefes” e níveis de abordagem diferentes. Toda a cobertura e possivelmente, proximidade com o fato, varia de emissora para emissora. Com isso, dá a se entender que, o Jogo Aberto, da televisão aberta, busca aproximar o telespectador do programa, utilizando de técnicas e personagens que prezam pelo entretenimento e por uma discussão “rasa”, ou que não se torna massivo ao público. Uma vez que, a Band teria mais variedade de acompanhantes, seja o torcedor, a dona de casa, a criança, o adulto, etc.

Por outro lado, o Linha de Passe faz o caminho “inverso”, ao invés de aproximar novos espectadores, entende-se que ele se preocupa em manter os que já estão fidelizados. Para isso, seu padrão de abordagem é técnico e que necessita de um entendimento maior do público. Isso é dado, de forma que seus telespectadores sejam, supostamente, amantes do esporte, e com isso, já tenham conhecimento sobre o assunto, buscando apenas se informar ou ouvir outra opinião de especialistas. 


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O Agro e a omissão da mídia no período eleitoral do Brasil

Por Laís Abreu


Como já tratamos aqui no Pluris, a forma como a mídia retrata o conteúdo ambiental é vaga e pobre, apresentando sempre um contexto básico sobre assunto, às vezes com manchetes exageradas, seguindo os interesses mercadológicos, focando em uma espécie de chamariz sensacionalista, que a linguagem da comunicação digital tem chamado de “clickbait”, mas sem trazer, todavia, informações de fato relevantes, sem despertar consciência e cidadania nas pessoas.  

 

Durante o período eleitoral de 2022, um levantamento feito pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apontou que sócios de empresas ligadas ao agronegócio desembolsaram R$15,3 milhões para campanhas de 480 candidatos, sendo um terço desse valor para o PL, partido do atual presidente do Brasil e candidato à reeleição. O que não nos surpreende são os breves relatos sobre essas notícias na mídia brasileira.  

 

Não é novidade que os grandes grupos econômicos de mídias são silenciadas, por complacência ou interesse mútuo, pelos “donos do agronegócio”, principalmente a Rede Globo, com a Campanha “Agro é Pop, Agro é Tech, Agro é tudo”. A negligência em relação ao modo de vida dos pequenos produtores rurais acontece quando tentam passar uma imagem moderna e positiva do agronegócio. Dessa forma, ao deixarem de lado as notícias sobre o investimento agro na campanha do atual presidente, a emissora apenas reforça seus interesses empresariais.  

 

É válido salientar que, durante o seu mandato, Jair Bolsonaro atuou para flexibilizar regras ambientais, reduziu multas, aprovou novos agrotóxicos, além de flexibilizar o armamento para os moradores de áreas rurais. A expansão do agro neste governo e a permanência de um grupo no poder só enfatiza cada vez mais o quanto o Agro é mais tóxico do que Pop.  

 

Ao jornalismo, é necessário acabar com esse retrocesso. Até quando nossos colegas de profissão continuarão silenciados por uma parcela da sociedade? Até quando silenciarão - por autocensura ou igual complacência? Até que ponto vale vender a ética profissional? A omissão sobre a verdadeira versão do agronegócio está tomando uma proporção cada vez maior e cabe a nós mesmos, os jornalistas, mudarmos esse rumo. 

 

As pautas ambientais gritam cada vez mais por nossas coberturas, é preciso propagar veracidade e conscientização.  O agro não é Tech, e não é Tudo, como reproduz a Rede Globo. O agro é também trabalho escravo, desemprego, fome, desmatamento. O agro é agrotóxico, conflitos por terras e desigualdade no campo. E quem perde com isso é sempre a sociedade e claro, a dignidade profissional do jornalismo. 


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segunda-feira, 3 de outubro de 2022

O NOVO POPULISMO E SEUS RISCOS (I)

 Por Gilson Raslan Filho 

Há um consenso sobre a importância central do Deputado mineiro André Janones 
nas eleições gerais deste ano, mas quais são os riscos do novo populismo que defende?


Textos de observatórios – especialmente os de mídia e de acontecimentos cotidianos, como este, que exigem alguma urgência no tratamento, em razão da temporalidade ultra acelerada da cultura midiática contemporânea – têm a virtude de apontar intuições e pistas para fenômenos complexos, que eclodem aqui e ali no tecido cotidiano. Essa virtude porém denuncia uma limitação importante: a rapidez na formulação de análises de acontecimentos complexos, no calor de sua eclosão, quase sempre torna os textos de observatórios parciais, quase superficiais.

Esse é o risco que se corre ao acompanhar acontecimentos das eleições gerais brasileiras deste ano. E mais ainda quando se entra em um terreno arenoso das lideranças políticas que têm nas redes sociais seu principal campo de atuação. Esse é o caso do deputado mineiro André Janones, sobre cuja atuação este texto e aproxima - e a temática se desdobrará em outros textos nas próximas semanas, dada a riqueza de temas que merecem atenção.

Janones é um verdadeiro fenômeno eleitoral. Mineiro de Ituiutaba, onde se formou em direito, ele se orgulha de suas raízes populares e gosta de lembrar que pagou sua faculdade sendo trocador de ônibus e que é filho de empregada doméstica. O deputado federal e candidato à reeleição retirou em agosto sua candidatura à presidência da República para apoiar o ex-presidente Lula.

Sua carreira política é tão meteórica quanto tortuosa: foi militante da corrente petista Democracia Socialista do Partido dos Trabalhadores até 2012, quando dá uma guinada à direita e se filia ao conservador Partido Social Cristão – que atualmente abriga o deputado estadual por MG e candidato ao Senado com apoio do presidente Jair Bolsonaro Cleitinho Azevedo, como Janones, ambientado nas redes sociais e com quem chegou a atuar proximamente. Em 2018, foi eleito no não menos conservador e ideologicamente disforme Avante, na esteira da estridente atuação em defesa dos caminhoneiros em greve naquele ano, um movimento que, apesar da pauta difusa, foi tomado por agenda proto-fascistas e deu forma ao refluxo ora conservador, ora autoritário que floresceu no Brasil nos últimos quatro anos.

Atualmente, o deputado André Janones tem um papel considerado decisivo nas eleições gerais, atuando em suas redes sociais como um “Carluxo do bem” da campanha do petista. Nas redes, Janones vem adotando uma estratégia belicosa, no mesmo molde das estratégias dos militantes de extrema-direita que mantêm um patamar de popularidade do presidente da República que lhe garante legitimidade no cargo. A estratégia, até o momento, tem dado certo e como o próprio deputado volta e meia lembra, o barulho e as provocações têm pautado e desnorteado a campanha de Jair Bolsonaro. Ao mesmo tempo, suas manifestações de campanha e as muitas entrevistas que tem dado proferem um discurso facilmente identificado com pautas do campo ideológico das esquerdas.

O caminho trilhado por Janones poderia muito bem ser taxada de errático e, no limite, oportunista. Ele próprio, todavia, denomina sua trajetória como uma manifestação do que chama de populismo, isto é, ele próprio se pauta pelas temáticas urgentes, as demandas das camadas populares – e, por essa razão, para se adaptar ao momento histórico “do povo”, ele provoca idas e vindas em sua postura.

Como se vê, há muito a se refletir sobre o fenômeno do “novo populismo” encarnado por André Janones, em razão da relevância político-eleitoral que alcançou e seu extraordinário manejo das redes sociais. Os próximos textos tentarão se aproximar um pouco do fenômeno.


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