terça-feira, 13 de julho de 2021

Manhãs de Setembro: Arte e Representatividade

Por Talita Brandão


Por que devo assistir a nova série brasileira da Amazon Prime, Manhãs de Setembro?


Imagem reprodução Google. Poster Manhãs de Setembro


“Você demorou 30 anos, 2 meses e 19 dias para ter um lugar só seu”

-Vanusa (Elisa Lucinda)


No final de junho o audiovisual brasileiro foi marcado pelo lançamento da série Manhãs de Setembro, estrelada pela cantora e compositora Liniker e dirigida por Dainara Toffoli. A série é de uma sensibilidade artística e humana tocante. Nela conhecemos a jornada de Cassandra (Liniker), uma mulher trans preta em busca de sua independência na cidade de São Paulo. Porém, no mesmo momento que Cassandra consegue certa estabilidade ao alugar uma kitnet para si, ela descobre a existência de um filho de 10 anos.


A trama apresenta um elenco rico, tanto em sua diversidade como em seu talento. Além de Liniker, grandes nomes como Linn da Quebrada, Paulo Miklos e Karine Teles fazem parte da obra. A série retrata a pluralidade da capital de São Paulo, traz referências da cultura musical brasileira indo de Alcione a Pabllo Vittar e ainda é exata em sua linguagem. As próprias gírias usadas pelos personagens já manifestam parte de suas histórias como também são jargões comuns na comunidade LGBTQI+.


“Eu sempre quis ser uma mulher fodona, independente, tipo você, tipo a Roberta, que nem esse povo que a gente vê na TV com esse blablabla todo aí. Mas é que no final das contas a gente nunca teve outra opção que não fosse essa.”

-Cassandra (Liniker)  


Falar de Manhãs de Setembro é falar sobre arte pura sem se perder na romantização. Ainda que a direção da série seja poética, com cada pausa entre as falas demonstrando algo sobre a narrativa, e cada música da trilha sonora sendo colocada no momento certo, os temas tratados na série não são passados de uma maneira idealizada. Seja ao abordar a maternidade ou a desigualdade social no Brasil, a série é certeira na conversa entre ficção e realidade.


Cassandra, a entregadora


Um dos momentos que Manhãs de Setembro prova isso é ao mostrar a rotina de Cassandra como entregadora por aplicativo em sua moto. Ao contrário do discurso de empreendedorismo muitas vezes propagado dentro das dinâmicas dos trabalhos em plataformas como Uber e Ifood. A série faz um papel importante ao retratar de forma sutil como esta lógica de trabalho na Uberização é precária, desregulada e retira os direitos dos trabalhadores.


Em certo momento da trama a moto de Cassandra quebra o que impede que ela trabalhe. Além de precisar de dinheiro para pagar o conserto da moto, Cassandra passa por dificuldades pois o dia em que não trabalha é um dia sem recursos. 


Outra cena que indica a situação de subemprego dentro do serviço em plataformas é com o controle do trabalho de Cassandra através das avaliações no aplicativo. Ao contrário da liberdade proposta na Uberização, na realidade os trabalhadores são monitorados constantemente.


Cassandra, a cantora

Imagem reprodução:Série Amazon Manhãs de Setembro. Cassandra cantando. 


O talento da Liniker e a potência de sua voz é explorado na narrativa da melhor forma através do sonho de Cassandra de ser cantora e sua paixão pelas músicas da Vanusa. Este dom foi somado às habilidades de atuação da Liniker e tornaram a emoção de Cassandra ao cantar um verdadeiro show. São nas cenas onde Cassandra canta que assistimos a personagem em seus momentos mais vulneráveis e também mais fortes.


O uso de Vanusa na trilha sonora foi o casamento perfeito para a série. E a relação entre Roberta (Clodd Dias), dona da boate onde Cassandra canta, e a protagonista são exemplos de parceria, amizade e apoio.




Cassandra, a pai



“Ela é uma mulher”

-Ivaldo (Thomas Aquino)

“Mas é meu pai.”

- Gersinho (Gustavo Coelho)


Um dos pontos altos de Manhãs de Setembro é como as relações pessoais são retratadas. Dainara Toffoli fez um grande trabalho ao deixar os personagens profundos e humanos o suficiente para que ao assistir a série seja possível amar e odiar cada um deles em um mesmo episódio.


Esta humanização é clara na relação de Cassandra com seu filho Gersinho. A construção e evolução da narrativa familiar é emocionante e não negligencia todas as facetas que envolvem as implicações de ter uma criança.


“A gente ainda tá aqui e é isso que importa”

-Pedrita (Linn da Quebrada)



Representatividade e arte se encontram perfeitamente nas Manhãs de Setembro.


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