sábado, 16 de janeiro de 2021

Mais importante do que ser é parecer ser

Ana Laura Corrêa        

Desde que assumiu a Prefeitura de Divinópolis, Gleidson Azevedo já publicou 18 vídeos em seu perfil no Instagram, apenas até o dia 16 de janeiro (com pouco mais de duas semanas de mandato), com média de mais de um vídeo publicado por dia. A descrição da página pessoal do prefeito traz: “Divinópolis agora tem prefeito!”. Nós, do Observatório Pluris, fomos então verificar as postagens de Gleidson Azevedo para verificar quem é esse novo prefeito - que desmerece todos os seus antecessores em uma frase.

Os vídeos publicados pelo prefeito, desde o início do mandato, têm entre 9 e 33 mil visualizações.

Destacaremos aqui, inicialmente, duas publicações. Em uma delas, ao lado do irmão gêmeo, o deputado estadual Cleitinho Azevedo - que está de recesso da ALMG (mas, vale lembrar, apenas até 31 de janeiro) -, Gleidson Azevedo ajuda a retirar um radar na avenida JK. Em outra publicação, o prefeito - ainda no dia da posse, em 1º de janeiro - ajuda a cortar uma árvore e retirar galhos caídos em uma via na cidade, após uma forte chuva.

Trecho do vídeo em que o prefeito retira radar da avenida JK (Foto: Reprodução/Instagram)

Diante desses posts, vêm alguns questionamentos. O primeiro é: são essas as funções de um prefeito eleito? Onde estão os servidores que deveriam fazer essas tarefas? Ou o estado mínimo está tão perverso em Divinópolis a ponto de o prefeito precisar exercer funções que não são suas? Se falta pessoal, por que ele, como prefeito, não abre concurso público para a contratação de servidores para fazer essas tarefas?

Outra pergunta que surge ao ver as publicações é: quais temas o prefeito escolhe para fazer vídeos e por quê? Por que ele resolveu “ajudar” pessoalmente nessas ocasiões e em outras não? Na página de Gleidson Azevedo, não há, por exemplo, vídeos relacionados às reuniões para o fechamento do comércio devido à pandemia.

Ele, em apenas duas semanas à frente da Prefeitura, passou por cima da decisão do comitê formado por profissionais da saúde e permitiu a reabertura das lojas em um momento crítico da pandemia de coronavírus na cidade. Silêncio nos posts. Até mesmo na entrevista coletiva que tratou do retorno à onda vermelha, quem mais falou foi a vice-prefeita, Janete Aparecida, enquanto Gleidson, tão acostumado a mostrar-se e a falar, ficou, assustadoramente, mais quieto e calado. Por quê?

Mais um questionamento: em que momento esses e outros vídeos são gravados e por quem? O expediente pode ser interrompido para o prefeito gravar vídeos para as próprias redes sociais, e não as da Prefeitura? Ou esses vídeos são feitos após o expediente? Quem filma é pago com dinheiro público? É um assessor particular do prefeito ou é servidor da Prefeitura?

Em outro vídeo, Gleidson Azevedo mostra os elevadores e veículos exclusivos aos quais os chefes do Executivo sempre tiveram acesso na Prefeitura. Ele disse que cortou essas “mordomias” e pede que a população viralize o vídeo para que o Brasil todo veja. Qual a necessidade dessa divulgação? Outras cidades vão mudar por causa de ações do prefeito de Divinópolis?

Como vivemos na era das selfies, das redes sociais, em que “parecer ser é mais importante do que ser” e tudo se transforma em espetáculo para os outros verem, o prefeito parece querer adequar a função de prefeito ao seu gosto pela exibição nas redes sociais. Afinal, o trabalho e as burocracias “normais” de um prefeito não são muito instagramáveis (de acordo com o que Gleidson & Cleitinho consideram instagramável), não geram muitas visualizações, curtidas, compartilhamentos e comentários.

Embora a lógica das redes sociais seja a do “parecer ser” (em que todo mundo quer parecer fitness, quer parecer que trabalha muito, quer parecer que estuda demais, que viaja o mundo inteiro, que visita as praias mais bonitas, cozinha os melhores pratos e come nos melhores restaurantes), essa lógica não se aplica à política. Para ser um bom prefeito é preciso, antes de tudo, ser. Fazer aquilo que deve ser feito, dentro das suas funções específicas, em prol da população.

Assinar papéis e ficar em um gabinete pode não ser um trabalho muito instagramável, mas, ainda assim, é possível, por meio de bons profissionais da comunicação, ter bons posts nas redes sociais. Essas publicações, no entanto, nem sempre terão muitas curtidas, comentários, compartilhamentos ou visualizações. Contudo, se as ações concretas contribuírem para a melhoria de vida da população da cidade, já é o suficiente dentro das funções de um prefeito. A população agradecerá em silêncio quando vir o ônibus sem aglomerações na pandemia. Fazer o quê? Querer ser visto, aplaudido e mostrar-se o tempo todo não significa fazer um bom trabalho. Ser prefeito é outra coisa. Divinópolis agora tem prefeito?

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